A compositora francesa Cécile
Chaminade (1857-1944) e a estadunidense Amy Marcy Cheney Beach (1867-1944) são
compositoras que sempre aparecem em obras de referência, isto é, dicionários e
enciclopédias de música. Ambas completam 70 anos de falecimento agora em 2014, e
passam a ter suas obras em domínio público, embora estas nunca tenham deixado
de ser interpretadas, no decorrer deste
período.
Amy nasceu em família musical,
com mãe pianista e cantora, estudou em Boston e atuou bastante como pianista,
instrumento no qual estreou aos 16 anos, tocando um concerto de Ignaz
Moscheles. Por algum tempo, foi solista frequente da Orquestra Sinfônica de
Boston e outras grandes orquestras, além de fazer recitais de piano solo.
Casou-se em 1885 com o Dr. Beach, e por insistência dela mesma, passou a
assinar Mrs. H. H. A. Beach (o nome dele). Embora tenha estudado harmonia com
Julius W. Hill, foi autodidata em contraponto, composição e orquestração, e
depois de casada, passou a se dedicar primordialmente a compor. Só voltou a
atuar como pianista depois de 1910, quando seu marido morreu; passou então 4 anos
na Europa, onde se apresentou em Roma, Paris e Berlim. Voltando aos Estados
Unidos, continuou compondo e tocando.
Amy foi a primeira estadunidense
a compor uma obra orquestral de porte, a Sinfonia em mi menor op. 32, Gaelica,
que estreou em 1896, pela Orquestra Sinfônica de Boston. Escreveu também uma
ópera, Cabildo e, em 1899, o Concerto para piano em dó sustenido menor op. 45.
Compôs também 4 cantatas seculares, no conjunto de uma extensa obra vocal que
inclui cerca de 200 peças para canto e piano, obras corais, uma Missa e
diversas outras obras sacras.
A Discoteca Oneyda Alvarenga, do
Centro Cultural São Paulo, possui dela a partitura de seu Tema e variações para
flauta e quarteto de cordas op. 80; e muitas de suas obras podem ser ouvidas no
YouTube.
Embora sua família não fosse
propriamente de musicistas, Cécile também recebeu os primeiros ensinamentos da
própria mãe, pianista e cantora. Começou a compor já na infância, e foi
recomendada por Georges Bizet para desenvolver estudos musicais, o que fez com
os renomados professores franceses de
sua época – mas em aulas particulares, já que o pai não consentiu que
frequentasse o Conservatório de Paris. Começou a tocar em público aos 18 anos e
logo foi convidada para uma turnê na França e na Inglaterra. O sucesso de suas
peças pianísticas foi imediato, depois de estréias em que foram interpretadas
por ela mesma.
Muitas de suas cerca de 200 obras
para piano e 125 canções foram escritas com vistas à publicação e por isso ela
é, até hoje, uma das compositoras mais editadas. Mas seu repertório abrange também peças de
mais fôlego, como a Suite d’orchestre op.20 (1881), Les amazones, sinfonia
dramática op. 26 (1888), La Sévillane, ópera cômica (1882), Callirhoe,
balé-sinfonia para grande orquestra, 2 trios com piano op. 11 (1881) e op. 34
(1887), Concertino para flauta op. 107 (1902) e Concerto para piano e orquestra (1893).
Um de seus Estudos de Concerto
op. 35 (nr 2, Outono), seu Concertino para flauta op. 107 e sua Scarf Dance , trecho
do balé Callirhoe (popularizada em inúmeras antologias de música pianística)
são peças até hoje tocadas e gravadas, e podem ser facilmente recuperadas no YouTube,
em excelentes gravações.
O Concertino para flauta, em sua
versão flauta e piano, foi gravado inclusive pelo duo Irmãos Carrasqueira
(Maria José e Antonio Carlos), ainda em LP, e foi apresentada em São Paulo
pelo flautista Renato Camargo, com acompanhamento de banda.
Os compositores brasileiros, em
geral, escrevem poucos concertos ou concertinos, devido à grande dificuldade de
conseguir orquestras que os toquem. Além disso, a preparação do material
orquestral é cara e dificultosa. Temos, entretanto, obras do gênero escritas
por Heitor Villa-Lobos, Francisco Mignone e Oscar Lorenzo-Fernandez. Temos
também o Concerto em formas brasileiras de Hekel Tavares, talvez o mais famoso
e mais apresentado.
Mesmo diante de inúmeras dificuldades, duas
compositoras brasileiras escreveram concertos para piano: Clarisse Leite e
Najla Jabor. O Concerto para piano e orquestra de Najla Jabor é de 1953 e
estreou em Recife, pelas mãos da pernambucana, pianista e também compositora
Graciette Câmara Quadros.
Najla Jabor terá seu centenário
de nascimento no próximo ano de 2015.
Clarisse Leite escreveu dois
Concertos para piano e orquestra: o primeiro é de 1972 e o segundo, para piano,
orquestra, órgão e coral, de 1975, não é só para piano: é um concerto tríplice.
Não temos notícia da estréia de nenhum dos dois, apesar da popularidade da
compositora.
Hoje há uma crescente procura por
obras de mulheres compositoras, cujas apresentações são cada vez mais
frequentes. Mas as performances se restringem, em âmbito mais tradicional, em
peças para piano, ou canto e piano; em âmbito mais atual, em peças de
conformação não estritamente tonal, e de discurso musical de sintaxe mais
abrangente. As óperas de Jocy de Oliveira, substancialmente performáticas, as
peças de caráter indigenista de Maria Helena Rosas Fernandes, a obra
nacionalista de Kilza Setti e Adelaide Pereira da Silva, as compositoras mais
recentes, Marisa Rezende, Silvia de Lucca, Denise Garcia e Valéria Bonafé,
entre outras, vêm encontrando espaço entre solistas e orquestras.
Sempre me entristece lembrar um
regente brasileiro radicado na Europa, que teve oportunidade de conhecer meu
livro Mulheres Compositoras – elenco e repertório. Ele comentou comigo que
achou o livro notável, mas que a obra de mulheres compositoras é “curiosidade”.
Será mesmo?
Só o tempo dirá.
Um comentário:
nossa, adorei, estou ouvindo agora uma obra da cécile chaminade. vou ouvir da outra compositora. as brasileiras mencionadas já ouvi alguns trabalhos, mas não para orquestra. parabéns como sempre pelo estudo. beijos, pedrita
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