quinta-feira, 27 de outubro de 2011

ONEYDA ALVARENGA, CLORINDA ROSATO E MARIO DE ANDRADE - Parte I

Vem dos tempos em que Oneyda Alvarenga e Clorinda Rosato cursavam o Conservatório Dramático e Musical de São Paulo a amizade que desenvolveram com Mario de Andrade. Este era professor de piano de Oneyda Alvarenga, e de história da música de ambas. Clorinda Rosato estudou piano com o prof. Miguel Antonio Gallo.

Oneyda Alvarenga revelou sua aptidão literária desde os primeiros contatos com Mario de Andrade. E quando ela se aproximava da conclusão de seu curso, ele a orientou (em uma escala um pouco diferente dos cursos de pós-graduação da atualidade) na escrita de seu texto A linguagem musical. Este texto, que mais tarde seria um trunfo importante em sua indicação para a chefia da Discoteca Pública Municipal, vem sendo analisado, no Instituto de Estudos Brasileiros da USP, pela doutoranda Luciana Barongeno, sob orientação da Profa. Dra. Flávia Toni.

O apoio e orientação que Mario de Andrade dedicou a Clorinda Rosato têm um caráter um pouco diferente. Segundo ela mesma me contou,um dia, estava tocando piano no Conservatório, e Mario se aproximou e perguntou que música era aquela.”Ora, uma brincadeira que eu mesma compus”, respondeu; ao que ele acrescentou: “Pois tem um pedal muito interessante”... A partir de então, e mesmo depois da conclusão do curso, ele continuou a apoiá-la em seu talento e vocação de compositora.
Um exemplo desse apoio está na Discoteca Oneyda Alvarenga, do Centro Cultural São Paulo. É uma narrativa que serve como apresentação da cópia xerográfica do manuscrito original do Noturno (à memória de Mario de Andrade), de Clorinda Rosato, tombada sob número P. 7873. O texto foi escrito por mim, à época Arquivista Artística da Divisão de Discoteca e Biblioteca de Música, nome que a antiga Discoteca Pública Municipal manteve enquanto constou do organograma do IDART, isto é, de 1975 a 1982. Como segue:

“PEQUENO HISTÓRICO DO NOTURNO – Esta é uma composição para piano, escrita em 1934. Nessa época Da. Clorinda estudava no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde era aluna de Mario de Andrade na classe de História da Música. / Sabendo do talento da aluna para a composição – ao qual dava todo incentivo – o professor pediu-lhe que escrevesse um ‘Noturno de expressão brasileira, com duração de três minutos’, para ser executado em recital em casa dele./ Da. Clorinda o escreveu no prazo de um mês./ A dedicatória à memória do professor deve ser bem posterior, pois o Noturno foi escrito em 1934 e o Prof. Mario de Andrade faleceu em 1945.
(As informações deste pequeno histórico foram fornecidas pela própria autora, exceto no que se refere ao ‘talento da aluna para a composição’, que é dedução nossa; modesta, Da. Clorinda jamais se refere ao seu talento) ”.

A obtenção da cópia do Noturno, de outras obras dela e mesmo um recital realizado por Clorinda Rosato em 3 de setembro de 1981 faziam parte de um projeto maior de reunião de depoimentos e obras de autores brasileiros, projeto este interrompido quando da mudança da Discoteca para o Centro Cultural São Paulo, em 1982. Em verdade, pudemos fazer muito pouco, do que estava previsto; mas mesmo este pouco serviu para que não se perca de todo a memória de muitos artistas talentosos, entre os quais Clorinda Rosato.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O PIANO DE CHIQUINHA GONZAGA

Muitos anos atrás, o piano de Chiquinha Gonzaga estava na casa de uma sua descendente, Dona Alzira, em São Paulo. É o mesmo instrumento em que a compositora aparece, já idosa, numa conhecida foto.
Quando mudei para São Paulo, meu tio Donato, falecido há muitos anos, conhecia esta senhora. E me levou à sua residência para conhecê-la, com a finalidade de criar um círculo de amigos para mim.
Logo que chegamos, ela nos contou que o piano tinha sido da Maestrina, sua antepassada, e perguntou se eu conhecia sua obra. Ficou desapontada quando eu disse que não...
Dona Alzira, viúva, tinha dois filhos, um com cerca de vinte anos, o outro ainda adolescente. E nós três nos entendemos muito bem. Em torno do piano que havia sido de Chiquinha, improvisamos um sarau: o filho mais velho tocava guitarra, o mais novo – que tocava de ouvido – ou fazia duo comigo no piano, ou cantávamos... Tudo entremeado de muita alegria e surpresas, sobretudo quando inventávamos juntos alguma música, ou parodiávamos algum sucesso da época.
Novata na cidade, eu não sabia direito onde estava, e até hoje não sei ao certo qual era a localização do prédio. Os fragmentos de memória que consigo reunir me levam ao Edifício Sérgio, na esquina da Avenida Brigadeiro Luís Antonio com a Rua Humaitá, mas não tenho certeza.
Na época, prometi voltar para nos divertirmos mais um pouco. Mas, em seguida, meu tio ficou fora da cidade por algum tempo, e eu não sabia chegar ao apartamento de Dona Alzira. E logo depois as aulas na Faculdade começaram. A vida me levou para outro lado.
Uns dez anos depois daquela visita, ou um pouco mais, li nos jornais que o piano de Chiquinha Gonzaga estava à venda porque Dona Alzira ia se mudar para os Estados Unidos, acompanhando um dos filhos. E eu nunca soube o destino daquele piano...
Mas sempre mantive uma certa tristeza, por ter dito (com sinceridade) a eles que não conhecia nenhuma obra da Chiquinha. Na verdade, eu conhecia, sim; mas só descobri mais tarde.
Quando estava escrevendo o livro Mulheres Compositoras, encontrei na antologia Juvenília, dos Salesianos, a linha melódica e a letra da linda canção Luar na serra, de Chiquinha Gonzaga.
Luar na serra era uma das músicas que cantavam para eu dormir, quando era pequena.