De 1958 para cá, não há quem não conheça o célebre Lampião de Gás, gravação de Inezita Barroso.
A autora desta música tão rica em sua simplicidade é Elisa
Campiotti Bérgami, a Zica Bérgami, nascida em 10 de agosto de 1913, em Ibitinga, e falecida
em São Paulo no dia 16 de abril de 2011. Na verdade, ela foi também escritora e
desenhista, e colaborou ilustrando matérias do antigo Suplemento Literário do jornal O Estado de S.
Paulo, com expressivos desenhos a bico de pena. Já muito idosa, foi homenageada
com uma linda exposição de seus trabalhos a óleo, e pelo que se depreende da
reportagem feita com ela para a televisão, nessa oportunidade, continuava tão
espirituosa como sempre foi.
Conheci Dona Zica pessoalmente, no início dos anos oitenta,
através de Inezita Barroso, que me deu
seu contato. Os dados publicados sobre ela em meu livro Mulheres compositoras – elenco e
repertório, foram fornecidos por ela
mesma.
No LP Inezita
apresenta cinco autoras, também de 1958, a gravação é de suas músicas Chuvarada
e O Batateiro, em que ela relembra um pregão de sua infância. Perguntei por que
Lampião de gás não havia sido gravada nesse LP, e ela me contou que na época
ainda não havia composto esta música, que seria seu maior sucesso. Esse LP, que
é a primeira gravação
feita no Brasil só com obras compostas por mulheres, foi o
tema do primeiro texto deste blog.
Nessa tarde dos anos oitenta, em Pinheiros, onde ela morava,
Dona Zica me contou que tinha
composto mais 78 músicas, que estavam ainda inéditas. Já neste século,
comprei um CD com mais 13 de suas músicas, gravadas com muita verve por Zezé Freitas, acompanhada por um time de
primeira linha, com produção de Filó Machado.
Nem tudo é saudosismo nas letras cantadas por Zezé Freitas,
mas tudo é, com certeza, uma brasileirice cabocla, inclusive na fala de
caipira, que ela imita muito bem. E
muito da mais fina ironia que caracteriza
nosso interiorano, como Eu vou
pra lua e Pimenta no rock. Há também o
sofrimento do pobre muito pobre, como Abana o fogo e Gafanhoto chegou!
Se não me engano, Dona Zica me disse que tinha fazenda, ou
cresceu em fazenda, o que explica essa escolha por um nacionalismo bem popular.
Esse é o tom de seus desenhos, de seus quadros, de seus escritos.
E talvez seja essa também a grande herança de Dona Zica: ver
as coisas em seu lado mais humano. Ela ri das pretensões de chegar à lua, caçoa
dos imitadores do rock americano , se emociona com a pobreza endêmica de nosso
povo, fala com saudade de uma tecnologia
absolutamente superada, mas que iluminou sua infância ... É sua vida, no que
ela viveu ou presenciou, que está ali em suas canções. É sua vida que está em seus quase cem anos de
escritos, desenhos, quadros. Todos simples, como ela. Todos muito, muito
humanos.
2 comentários:
Sou cantora e estou pesquisando compositoras. Gostaria de ter mais informações sobre Zica Bergami. Estou encantada!
Sou cantora e estou pesquisando compositoras. Gostaria de ter mais informações sobre Zica Bergami. Estou encantada!
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